terça-feira, 4 de outubro de 2011

Como assim eu vou fazer um gibi? (ou como eu acabei virando um roteirista - parte I)

Vamos começar do começo.

Eu sou um cara de teatro.

De um tipo bem específico de teatro.

Esqueçam a maquiagem branca na cara, as performances que sempre rolam quando a figura está chapada, seja numa balada ou num batizado, as poses afetadas e aquela voz carregada que mais parece cria do inferno do que garganta de gente de verdade.

Essa fase eu vivi dos 17 aos 27, depois cansei.

Foi justamente quando encontrei o Teatro Popular União e Olho Vivo. Não sabe de quem estou falando? Não esquenta, clica na postagem que fiz sobre o plágio envolvendo o gibi Chibata e você vai entender melhor.

Sentado, como Mão Negra, um dos líderes da Revolta da Chibata, na peça "João Cândido do Brasil".
E foi onde eu passei os últimos dez anos da minha vida. Um lugar mágico, onde aprendi praticamente tudo que sei sobre teatro, arte e cidadania.

Por razões pessoais, decidi, lá por novembro do ano passado, que me afastaria do grupo por um tempo. Naquela época – embora eu ainda não soubesse – já estava afundado até o pescoço nos quadrinhos. Um sujeito se encarregaria de colocar o pé na minha cabeça e me afundar de vez, mas eu já chego lá.

Só que foram dez anos de minha vida naquele grupo, correndo a periferia da cidade, viajando o Brasil, sorrindo, chorando, vivendo…

Eu não sairia assim, tão impune.

Eu de amarelo no meio, num puta de um juiz ladrão em "Barbosinha Futebó Crubi - Uma Estória de Adonirans"

A verdade é que quase enlouqueci. Naquele galpão do bairro do Bom Retiro, colado no centro velho de São Paulo, está boa parte de minha história e – sem dúvida alguma – muito da alma que penhorei quando decidi ser um artista.

Sou capaz de interpretar um assassino cruel numa cena e, três minutos depois, enquanto o público ainda está tentando processar a carga dramática que acabou de receber, entrar travestido de uma drag bêbada. Consigo fazer uma voz num registro agudo e alterá-lo para o grave dentro da mesma fala. Tenho uma voz potente, raras vezes precisei de microfone em apresentações a céu aberto…

Bela bosta!

Sou ator e quase não consegui escapar de um simples conflito emocional por uma decisão que eu mesmo tomei!

E era nesse pé em que as coisas estavam quando em janeiro, numa visita a Belo Horizonte, conheci pessoalmente o amigo e roteirista Wellington Srbek, com quem já trocava intensa correspondência desde julho do ano passado.

Entre muito bate papo e uma ótima pizza, ele me convidou a participar de uma reunião que faria dali a duas semanas, aqui em São Paulo, com uns caras com quem ele estava querendo trabalhar.

Foi naquela noite que descobri que ele havia acabado de se tornar o editor da Nemo. Como é de hábito, fiquei de boca calada.

Mas estava empolgadíssimo! Meu amigo era agora um editor! Publicaria quadrinhos e tinha acabado de me convidar pra uma reunião secreta, com uns tipos perigosos, armados até os dentes de pincéis e nanquim…

Na data marcada, fui pra tal reunião com a esperança que o Srbek me convidasse pra escrever o texto de introdução de algum álbum. Afinal, por qual outro motivo ele teria convidado um resenhista para a reunião?

Confesso, eu sou uma besta às vezes…

Não vou contar quem estava ou não na reunião e nem o que foi conversado. Alguns nomes não são segredo, além do Wellington e de mim, o Will estava por lá para fechar sua participação em Ciranda Coraci e o Senhor das Histórias. O Daniel Estevescom quem já havia cruzado algumas vezes mas nunca havia sido formalmente apresentado – estava ali para fechar sua participação num dos álbuns. O Jozz também foi, embora só tenha saído de lá sabendo que faria um álbum para a Nemo, mas ainda sem saber que se tratava de Otelo, de Shakespeare. O Wanderson de Souza também estava lá, tão perdido quanto eu.

Srbek & Will, no lançamento de Senhor das Histórias e Ciranda Coraci

E eu pensando na tal da introdução…

Em um determinado momento, entretanto, depois de nos contar o que era a Nemo e qual seria seu projeto editorial, o mineiro vira pra mim e pro Wanderson e atira à queima roupa, sem qualquer chance de defesa:

- Aliás, é melhor vocês sentarem mais perto e virarem os melhores amigos, porque provavelmente  
vão fazer um álbum juntos

Eu não sei exatamente que cara eu fiz, mas deve ter sido de um pavor absoluto. Só o Wellington percebeu. Se o Will reparou, foi educado em disfarçar.

Como assim eu faria um gibi???
(continua na próxima quinta)

6 comentários:

  1. Sacanagem... até quinta por mais?? Isso não se faz...

    Bom, pelo menos eu sou amigo do resenhista mais foda de quadrinhos do país e de um roteirista (que já sei será foda tb) de gibis...

    Alguma chance d'eu não comprar mais gibis e ganhá-los? he he he

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  2. Não vou contar o que eu já sei dessa história, deixando o suspense tão bem engendrado pelo nosso amigo que rasga gibis, mas vou dizer duas coisas. 1 - sim, percebi o susto dele naquele momento e 2 - tenho sorte de ter virado amigo desse cara.
    Baita abraço!!!

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  3. Pô, só na semana quem vem? Taí, o cara mostrando o motivo pelo qual foi escalado para texto de arte sequencial. Agora por favor, recuse qualquer convite da globo para fazer novela!!

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  4. Luquinha, não sou assim tão foda! Sou lindo, é verdade, mas de resto sou bem comunzinho!
    Abraços,

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  5. Eu sabia que você tinha percebido! Tinha certeza disso Will!
    Mas uma das coisas mais bacanas dessa minha aventura nos quadrinhos foi ter conhecido caras como você. Tenho orgulho de ser seu amigo (e quem sabe um dia seu parceiro de HQ?).
    Grande abraço, meu irmão.

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  6. Gilmar, meu velho, posso te garantir: a Globo está fora de cogitação! Sei que sou parecido com o Brad Pitt e tal, mas não vai rolar. No mais, esse negócio de gibi vicia né? Valeu meu irmão, pelo apoio e pelo carinho!

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