quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

2011

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Que ano…

Tudo o que eu queria quando me afastei do teatro no final de 2010 era um pouco de sossego pra resolver uma penca de problemas aqui em casa.

As vezes me pergunto porque fui dar ouvidos a minha esposa e ao Lucas Pimenta pra fazer um blog.

Fiz.

E nunca me diverti tanto.

2011 começou com o pé na porta da minha pacata vidinha suburbana. Culpa do Wellington Srbek. Janeiro nem tinha chegado na metade e eu já ia fazer um gibi pra Editora Nemo.

al173100001944Não sei exatamente se já deixei claro o que isso representou pra mim. Eu sou um leitor compulsivo de quadrinhos. Aprendi a ler com eles quando tinha apenas 6 anos. E lá se vão 33 anos e milhares e milhares de gibis.

Meu primeiro sonho foi ser desenhista de quadrinhos. Sou um mal desenhista mas, ao que tudo indica, tenho jeito pra escrever.

E não é todo dia que a gente consegue realizar um sonho de infância.

Mas 2011 também foi um ano pra estreitar amizades.
O Will, o Laudo, o maluco do Daniel Esteves, o Flavio Luiz, a galera do Quarto Mundo, o Gilmar, o Gustavo e, claro, o Wanderson, que aturou por meses minhas loucuras e apesar disso conseguiu manter a sanidade e o talento intactos pra desenhar Sonho de Uma Noite de Verão.

E também mais um monte de gente que conheci na estrada e por quem fiquei encantado, como o Aloisio de Castro, os gêmeos Magno e Marcelo Costa, o Kris Zullo, o Arnaud, o Rafael Química, o trio gaúcho Pax, Azeitona e Santolouco (talentosíssimos malucos e gente da melhor qualidade) e mais um monte de profissionais e leitores aos quais já peço desculpas antecipadas pela imperdoável indelicadeza por não cita-los nominalmente aqui. Culpa da minha memória de formiga sem antenas.

E o ano de 2011 também marcou a despedida da Livraria HQMix.

Calma, caso você tenha ficado fora no último mês, a HQMix não acabou. Apenas vai sair da Praça Roosevelt, no centro de São Paulo.

O que só aumenta minha admiração e amizade pelo Gual, pela Dani e pelo Floreal.

Mesmo com as incertezas que um processo de mudança desses causa, eles nunca deixaram a peteca cair. Devo a eles algumas das minhas melhores conversas durante o ano de 2011 e – sem qualquer sombra de dúvidas – minha eterna gratidão por toda a amizade e carinho que eles, incondicionalmente, sempre ofereceram a mim e a minha esposa (que continua toda parafusada).
E como não poderia deixar de ser, devo muito (mas muito mesmo) ao Lucas Pimenta, ao Sergio Barreto e ao Marcello Fontana. A amizade deles é um dos meus principais faróis. Graças a esses baianos (o Marcello diz que é mineiro, mas acho que é mentira) atravessei todo o ano de 2011, apesar dos buracos que peguei.

E tem também o Adalton, o Portilho e toda a turma do Quadro a Quadro. É uma delícia fazer parte dessa turma.

E para o ano que vem a lista só aumentará, tenho certeza.

De cara já posso contar que virá mais um volume da coleção Shakespeare em Quadrinhos, pela Nemo, e mais dois projetos bem bacanas em parceria com o Will.

E que venha 2012!

E a gente se encontra por aí…

Lillo – 22/12/2011
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sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

Sangue no chão e um cheiro podre no ar

Honra e vingança.

Boa parte da história moderna só existiu graças a força da honra e ao poder da vingança.

O restante foi construído sobre os escombros de seus contrários.

E as duas partes foram amarradas com a promessa divina do idílico paraíso ou da danação eterna.

E isso resume toda a história ocidental.

E também define nações.

A mais proeminente de nossa era – a estadunidense – é pródiga em exemplos de valor, ou ao menos soube vendê-los de maneira atraente às demais nações.

Não entrarei aqui na já repisada discussão sobre a imposição de ícones como forma de dominação cultural. Gente de muito maior valor já fez isso de forma bem mais competente¹. Não que discorde de uma boa parte da opinião deles ou a ignore, diga-se.

Mas quero falar de um daqueles ícones norte americanos que habitam a imaginação coletiva mundo afora. Um lugar em que qualquer guri de sete anos sabe que os fracos morrem cedo e só os fortes sobrevivem: o velho oeste americano.

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Todos já assistimos a um bom filme de faroeste. A maior parte tem como referência os excelentes e deliciosos Bang Bang a Italiana imortalizados pela TV Record nos anos 80, onde O Dólar Furado (1965) seja talvez o maior expoente. Mas também existem verdadeiras obras primas do cinema. Filmes com tal requinte e sofisticação – e ainda assim tão intensos – que nada ficam devendo a clássicos como O Poderoso Chefão ou Laranja Mecânica (apenas para citar dois exemplos de gêneros bastante distintos). Estou falando de filmes como Era Uma Vez no Oeste, Meu Ódio Será sua Herança ou Os Imperdoáveis.

São filmes onde honra e vingança são o ponto central do roteiro e ajudaram a consolidar a imagem do velho oeste em todo o mundo, influenciando – além do próprio cinema – a literatura, a música, a moda e, claro, os quadrinhos.

Do popular italiano Tex ao seu sofisticado conterrâneo Ken Parker, passando pelas milhares de histórias norte americanas das décadas de 40 e 50 e até pelo brasileiríssimo Chet, não faltam bons exemplos de quadrinhos sobre aquela terra de bravos.

Mas de vez em quando aparece um daqueles gibis que te fazem prender a respiração e suar frio, à espera de quem sacará primeiro a sua Colt

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Oeste Vermelho não é um bom gibi.

E antes que vocês estranhem, já que só resenho o que gosto, explico: Oeste Vermelho não é um bom gibi porque não é simplesmente um gibi.

Oeste Vermelho, dos gêmeos Magno e Marcelo Costa (Devir Livraria – 88 páginas – R$ 34,50 ) é um trago de uísque batizado, a anágua à mostra de uma prostituta barata, o olhar assustado de um repórter recém chegado de San Francisco ou Chicago…

Oeste Vermelho tem cheiro de pólvora.

Fazer um gibi de Faroeste, um gênero tão explorado e, como já disse, tão arraigado em nosso imaginário não é tarefa fácil.

E os gêmeos sabiam disso com certeza…

Do contrário, como explicar que os protagonistas de Oeste Vermelho sejam basicamente gatos e ratos?

Uma sacada assim – ainda que não faltem precedentes nos quadrinhos (e entre eles o magnífico Maus) – funciona como um farol numa tempestade em alto mar.

O que não adiantaria de absolutamente nada se Oeste Vermelho não fosse uma baita duma história.

Vamos aos fatos: ratos são nojentos, gatos são peludinhos e macios; ratos trazem a peste, gatos trazem seus corpos pra gente ficar passando a mão; e gatos caçam ratos, não nos esqueçamos…

Mas no mundo dos Cartoons a situação é inversa. Talvez sejam aqueles lindos e pedintes olhos de contas dos roedores, imbatíveis se comparados aos dissimulados olhos dos gatos. Talvez seja a incontestável inferioridade física dos ratos que nos desperta o velho sentimento de torcer pelo mais fraco.

Ou talvez a culpa seja mesmo do Mickey…

O fato é que nos afeiçoamos aos ratos, tanto nos desenhos animados quanto nos quadrinhos.

O que não quer dizer necessariamente que Oeste Vermelho seja uma história bonitinha com ratinhos e gatinhos

Aliás, Oeste Vermelho pode ser tudo, menos uma “história bonitinha”…

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Não espere novidades. Se você é realmente um fã de faroeste, com certeza já viu a história antes: um fazendeiro pacato, que tem uma antiga rusga com o chefão da cidade, é publicamente desacreditado quando tenta alertar a todos sobre o risco iminente de uma invasão de bandoleiros assassinos.

O resto da história será a desgraça, redenção e vingança de nosso herói, que não descansará enquanto o último inimigo não estiver com uma bala na cabeça.

Absolutamente nada de novo.

Mas o jeito como esses dois caras contam a história…

Primeiro: sobram referências.

E aqui estou falando de referências de verdade, não de plágio ou clichês. Da vestimenta da personagem principal a aparência dos estabelecimentos, o que não faltam são homenagens à extensa filmografia do gênero.

Mas a referência mais genial é exatamente a mais sutil. Os irmãos Costa estruturaram Oeste Vermelho de uma forma inusitada. Sai a ação vertiginosa que permeia boa parte da produção de quadrinhos atual e entram longos e lentos planos, apagam-se as explosões e a pirotecnia habitual e entram os detalhes, o explicito cede lugar ao implícito, criando uma atmosfera desoladora.

Não reconhece o clima? Então procure pelos filmes Por Um Punhado de Dólares, Três Homens em Conflito ou Era uma vez no Oeste, e conheça um dos mais geniais diretores de todos os tempos: Sergio Leone (1929 – 1969), o autor de alguns dos melhores filmes do gênero em todos os tempos.

Uma justa homenagem que confere ao gibi um ritmo narrativo excepcional.

Segundo: roteiro e arte não possuem concessões.

Esqueçam os meninos, Oeste Vermelho é um gibi pra homens – ou pra mulheres, vocês entenderam…

Nada de cowboy de sorriso de diamante, nada de escapes cômicos, nada – absolutamente nada – de concessões. Se é pra ser mau, a crueldade é verdadeira. Se é pra se vingar, não tem perdão.

E se não bastasse tudo isso, a impressão que se tem ao terminar a leitura de Oeste Vermelho é a de estarmos diante dum gibi sério, onde o carinho e esmero com que foi feito simplesmente são visíveis em cada quadro, em cada diálogo.

Quase se dá pra ouvir uma gaita tocando no fundo…

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¹ Super Homem e seus Amigos do Peito – Ariel Dorfman e Manuel Jofre – Editora Paz e Terra (mas facilmente encontrado nos sebos também numa edição do Círculo do Livro).

domingo, 4 de dezembro de 2011

Bang!

Bang!

Mas a maior parte dos autores prefere Blam!

Porém Bang! é mais universal, é o tiro clássico. Com outro Bang! vira faroeste, sozinho é morte certa.

E sempre existe um corpo, quando não vários.

E em Minas Gerais eles pareciam brotar dos estandes do FIQ.

3 Tiros e 2 Otários

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A habilidade de Daniel Esteves com diálogos já é bastante conhecida. O trabalho que ele desenvolve na Nanquim Descartável já lhe rendeu vários prêmios e é sucesso de público e crítica.

Aliado a arte sempre competente de Caio Majado (Orixás – do Orum ao Ayê), já era de se esperar algo bom do lançamento que os dois prepararam para o FIQ.

O que não se esperava era o insano ritmo de 3 Tiros e 2 Otários.

A premissa é bastante simples: dois amigos trancados num quarto, um tiro e o corpo de uma garota.

Quem matou? Quem não matou? Numa situação extrema, como confiar em seu amigo? A trepada valeu a pena depois de tanto sangue?

3 Tiros e 2 Otários imprime um ritmo vertiginoso a um diálogo que não deixa por menos. Regado a palavrões, o conteúdo de 3 Tiros justifica o aviso impresso na capa: não recomendável para pessoas sensíveis.

Talvez não seja totalmente verdade.

Pessoas sensíveis podem sim ler 3 Tiros, mas provavelmente verão seu castelo de cartas, onde habitam princesas indefesas e nobres guerreiros, onde o amor tudo pode e tudo redime, desabar com a velocidade de uma bala.

Matinê

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Matinê, dos gêmeos Marcelo & Magno Costa, já começa bem logo pela capa – um convite para qualquer curioso.

Mas a história…

Matinê alia a arte fantástica dos gêmeos (com direito à participação especialíssima de Marcio Moreno) a um roteiro cinematográfico, no melhor estilo Tarantino.

Um matador de aluguel no covil de um mafioso, um contrato que não pode ser quebrado e um leão de chácara que lê a Bíblia nas horas vagas compõem um cenário perfeito para uma aventura rápida, inteligente e sangrenta.

Mas o principal trunfo de Matinê reside num humor sutil.

Não um humor deliberado, feito de piadas fáceis, mas sim um tipo de humor majoritariamente gráfico, guardado minuciosamente em pequenos detalhes de cenários e acessórios das personagens.

Um humor que caminha durante toda a história com uma desenvoltura sem igual, desde as alucinações de um gaiato que comprava drogas no covil até o inusitado pagamento do contratante do matador de aluguel. Contratante este também inesperado, que se por um lado carece de uma explicação formal sobre os motivos que o fizeram procurar os serviços profissionais do assassino, por outro nos dá motivos de sobra para legitimar a chacina.

Um final perfeito para um gibi irretocável.

 

3 Tiros e 2 Otarios terá lançamento e noite de autógrafos em São Paulo no próximo dia 09/12, na Livraria HQMix ( Pça Roosevelt, 172 – Centro ), a partir das 19:00hs.

Já os gêmeos Marcelo & Magno poderão ser encontrados na Quanta Academia (Rua Dr. José de Queirós Aranha, 246 – Vila Mariana), no dia 16/12, onde lançarão Oeste Vermelho a partir das 18:00hs.